Fim de Século e de Milênio


        O tempo é regulado, neste Mundo, em função da rotação da Terra em torno de seu eixo e de sua órbita em redor do Sol. O calendário em vigor é o gregoriano estabelecido pelo papa Gregório XIII, em 1582.
        O século XX assinala acontecimentos sumamente importantes para a Humanidade. A consolidação de verdades espiritualistas, sobretudo espíritas, é o mais relevante. O progresso científico e tecnológico alcançado é notável. Marcou, por outro lado, dois grandes conflitos armados: a guerra de 1914 a 1918 que envolveu várias nações e a de 1939 a 1945 que arrastou os Continentes à luta armada, sendo este o de maior proporção em toda a História. A Organização das Nações Unidas é outro marco basilar que pode pôr fim aos conflitos mundiais e a muitos atritos entre nações. A proscrição das guerras da face do Planeta deve ser objetivo de todos os povos e constitui experiência iniciada neste século. Há, todavia, vários focos isolados de desentendimentos de origens econômicas, ideológicas, religiosas e até a abominável causa racial, muitas vezes velada no imo das criaturas. Aos poucos o ser humano acaba por entender que a cor da pele não tem nenhuma relação com a maior ou menor claridade espiritual. Essa verdade cristalina será inapelavelmente gravada na mente humana por força do progresso e da evolução.
        A visão panorâmica da História mostra que muitos vultos proeminentes enviados em todas as épocas ao solo da Terra, como missionários, foram envolvidos pelas tentações que a matéria densa enseja e cometeram erros nas missões de que foram incumbidos. São desvios que ocorrem sob o jugo do orgulho e das ambições. Contudo, as sementes dos ideais nobres que trazem não se perdem. De um ou de outro modo terminam por germinar no solo generoso. Outras, mesmo sepultadas com aparência de morte, germinam no porvir. Os desígnios de Deus se cumprem não obstante as fraquezas e incompreensões humanas.
        Allan Kardec, o nobre codificador da Doutrina dos Espíritos, representa exemplo de vida fecunda e gloriosa, sem os entraves das paixões e dos erros clamorosos. Para implantar o progresso eminentemente moral, certos vultos famosos entregaram suas vidas a finais trágicos e dolorosos, por vezes desviados do que se propuseram realizar. Com o codificador da Doutrina Espírita isso não se deu. Até o tempo de sua fecunda existência encarnada, apesar das barreiras e incompreensões, sua vida primou pela firmeza de propósitos, retidão de caráter e cumprimento rigoroso do dever para com o semelhante e a verdade.
        Indaga-se, às vezes, por que Deus não assegura, desde logo, o êxito das incumbências de Seus enviados? É o mesmo que perguntar: Por que Ele não cria Seus filhos perfeitos? A Doutrina Espírita nos esclarece que cada um deve alcançar a perfeição por seus próprios meios e recursos. Que mérito haveria se tudo nos fosse proporcionado sem a participação de nosso esforço? Quem pode o mais, pode o menos. Se nos criou, poderia, se quisesse, nos fazer perfeitos. O ser humano é a criação por excelência. Somos criados simples e ignorantes, todos iguais, em harmonia, portanto, com infalível e soberana Justiça Divina. Diante de tais lições a Doutrina nos faculta entender a razão pela qual algumas missões são desviadas de seus objetivos ou fracassam. Os desejos humanos podem não colher, porém os desígnios divinos jamais deixam de realizar-se.
        As imperfeições ainda perduram nos dias atuais. Ao lado dos que buscam o pão de cada dia no trabalho penoso, encharcado de suor, encontram-se os que vivem a expensas alheias explorando fraquezas dos semelhantes, usurpando-lhes bens e recursos. Há os que mercadejam com a fé e os que dedicam suas vidas em benefício do próximo, gratuitamente, muitas vezes com enorme sacrifício na prática da caridade.
        Os erros e abusos cometidos em nome do Pai Eterno e do Cristo de Deus têm gerado conseqüências danosas. O Cristianismo, tantas vezes desvirtuado, retorna, passo a passo, à sua pureza primitiva. O Espiritismo é o autêntico instrumento desse retorno aos caminhos da evolução e da verdade. Felizmente estabeleceu-se sem o sacrifício de vidas embora arrostando oposições de toda ordem como ainda se verifica nos dias atuais. Mas está patente que se firmou definitivamente. Este fim de século e de milênio deixa isso irrecusavelmente manifesto. Veio para permanecer, para sempre, como patrimônio da Humanidade, como foi prometido.
        O século XX parece estar marcado como o último período dos grandes conflitos entre povos e nações. Embora ainda haja muitos desajustes na sociedade humana, o ambiente terreno já comporta o entendimento de que esses obstáculos serão superados a fim de que nova era de paz seja alcançada com base na fraternidade. Mais ou menos dias, finalmente, o mandamento maior de Jesus, o do amor, será observado.
        É indiscutível que esse período mostra o maior progresso de todas as eras, mas deixa evidenciadas dificuldades conseqüentes. As devastações de florestas, a poluição do ar e das águas, a interferência que as atividades industriais causam na natureza colocando em risco a segurança da vida das pessoas, são fatos preocupantes e terão que ser devidamente apreciados a fim de se encontrar solução urgente e adequada para tais ocorrências.
        Os acentuados avanços científicos e tecnológicos dos tempos atuais não são, lamentavelmente, acompanhados pelo aprimoramento moral das criaturasna mesma proporção, o que é essencial para uma vida melhor. O Espiritismo esclarece que habitamos um mundo de provas e expiações onde o mal predomina. Para podermos transitar num mundo regenerador temos que vencer grandes desafios. A miséria e a pobreza reinantes são exemplos típicos. Para extinguir  primeira e melhorar as condições de vida na pobreza é necessário, antes, superar difíceis e poderosos obstáculos, sendo os principais o egoísmo, o orgulho e a ignorância, responsáveis por inúmeras outras calamidades e pavorosos enganos que vicejam no caminho humano. Para transpor tais barreiras será necessária a adoção dos postulados universais do amor e da fraternidade, não existe outra maneira. O pequenino coração humano deve ser, sempre, abrigo de afeição, mas, freqüentemente, se torna covil duradouro de ódios e sentimentos vis ou cemitério de ilusões.
        Deus, espírito e matéria constituem a trindade universal. Tudo que existe em toda parte atesta a existência de Desu e de Suas leis. O espírito é elemento real, não é uma abstração, uma conjetura, como outrora se concebia. Ele se encontra em todo o Universo nos espaços e junto à matéria, atua na Natureza pois é um ser eterno e inteligente. As provas de sua existência são exuberantes, em toda parte. A matéria, por sua vez, é objeto de incessantes estudos e pesquisas, e já está demonstrado que existe em estados inacessíveis aos nossos sentidos físicos quando privados de recursos e meios tecnológicos ou científicos.
        O advento do Espiritismo deu-nos a oportunidade de saber, outrossim, que não há no Universo espaço vazio. Tudo é preenchido pelo fluido universal do qual provêm todas as coisas. Contudo, a origem da matéria ainda constitui um dos mistérios que, por enquanto, não alcançamos. Temos que conquistar, antes, a humildade a fim de conseguirmos nos ajustar à realidade. Tal virtude nos faculta acesso às verdades eternas, por meio de estudo, perseverança, esforço nas tarefas do bem e do amor ao próximo. Eis para onde aponta a agulha da bússola do Consolador indicando o rumo do futuro ditoso.

Washington Borges de Souza
 

( Texto retirado da revista "Reformador", Julho, 1999, pág. 12 )


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