Benedito da Gama Monteiro
Origem, conteúdo doutrinário e prática ritual estabelecem
as diferenças fundamentais entre Espiritismo e Umbanda. Apesar da
clareza dessas distinções, isso não deve ser razão
impossibilitante para que entre espíritas e umbandistas haja respeito
mútuo, espírito de compreensão e sensatez, embora
essa tolerância não deva resultar em conivência e omissão.
Deolindo Amorim, em seu livro "O Espiritismo e as Doutrinas Espiritualistas",
conclui, afirmando:
"O Espiritismo é uma doutrina que se basta por si mesma, sem
empréstimos nem acréscimos artificiais."
À luz dessa precisa orientação, observamos que nem
mesmo nos arraiais espíritas essa diferença é feita,
especialmente por aqueles que não se dão ao trabalho de estudar
a Doutrina, sem falar em parte da imprensa leiga que, de propósito
ou não, anuncia tudo o que ocorre nas tendas e terreiros como sendo
Espiritismo, disso se beneficiando os opositores sistemáticos, que
esperam levar vantagem com a confusão estabelecida.
Fala-se em "baixo Espiritismo"e "alto Espiritismo"; em Ëspiritismo
de mesa" e "Espiritismo de terreiro", etc., como se houvesse mas de um
Espiritismo!
Quanto à origem, sabemos que Espiritismo é a doutrina codificada
por Allan Kardec, recebida de vários Espíritos Superiores
no século passado, caracterizando-se por um conjunto de princípios
de ordem científica, filosófica e religiosa, que objetiva
o progresso espiritual do homem, com a implantação da fraternidade
entre todas as criaturas na Terra.
A Umbanda deriva-se, fundamentalmente, do culto religioso da raça
negra da velha África. Os seus princípios doutrinários
são realmente frutos de "folclore", dos provérbios, aforismos,
das lendas, ças populares, cnções e tradições
do negro africano.
Com referência ao conteúdo doutrinário, sabemos que
o Espiritismo se assenta em postulados científicos, filosóficos
e éticos, o que não se dá na Umbanda, que não
tem doutrina codificada, embora seus adeptos aceitem a imortalidade da
alma, a reencarnação e a lei de ação e reação,
como fazem os espíritas.
Quanto à prática ritual, a Umbanda difere, essencialmente,
do Espiritismo porque aquela atua no plano da natureza e este no do pensamento,
pois que só o Espírito conta, realmente. Aliás, o
Espíritismo não tem ritual de nenhuma espécie, pois
não admite corpo sacerdotal hierarquizado ou não, cerimônias
(batizados, casamentos e quaisquer outras); não se utiliza de fórmulas,
invocações, ou promessas de qualquer natureza; repele a adoração
de imagens, símbolos, amuletos; rejeita crendices e superstições
e não admite pagamento pela prestação de assistência
espiritual ou de qualquer auxílio, que conceda aos necessitados.
As tentativas para fundamentar a introdução de rituais, incensos,
imagens, e outros objetos de culto material no meio espírita invocam,
sempre. um pressuposto espiritualista, como generalidade, ou fazem apelo
à tolerância. Não há, entretanto, razão
alguma para tais pretextos, uma vez que o Espiritismo, pelas suas disposições
doutrinárias, dispensa completamente qualquer forma de ritual ou
peças litúrgicas.
Assim sendo, onde houver qualquer manifestação de culto exterior,
não
existirá a verdadeira prática espírita.
Apesar do louvável entusiasmo de alguns espíritas para a
comunhão de seitas religiosas no seio da Doutrina, a mistura heterogênea
sempre sacrifica a pureza íntima da essência! A qualidade
de substância espírita reduzir-se-ia pela quantidade de mistura
de outros ingredientes religiosos.
O Espiritismo não é doutrina separativista, nem ecletismo
religioso em torno do Espírito imortal! É, principalmente,
uma idéia de solidariedade fraterna entre todos os homens! Pode
abrigar, em espírito, todos os credos e religiões que firmam
suas doutrinas e postulados na realidade imortal. Mas seria insensata a
mistura heterogênea de práticas, dogmas, princípios
e composturas devocionais diferentes, entre si, para constituir outro movimento
espiritualista excêntrico.
A missão da Doutrina Espírita, enfim, é libertar o
homem e não prendê-lo ainda mais às fórmulase
superstições do mundo.
Finalizamos, fazendo nossas as observações sensatas do Espírito
Emmanuel, na mensagem
Doutrina Espírita, concitando os Espíritas
a zelarem pela doutrina que professam:
"Porque
a Doutrina Espírita é em si a liberalidade e o entendimento,
há quem julgue seja ela obrigada a misturar-se com todas as aventuras
marginais e com todos os exotismos, sob pena de fugir aos impositivos da
fraternidade que veicula.
Dignifica, assim, a Doutrina que te consola e liberta, vigiando-lhe a pureza
e a simplicidade, para que não colabores, sem perceber, nos vícios
da ignorância e nos crimes do pensamento.
'Espírita' deve ser o teu caráter, ainda mesmo que te sintas
em reajuste, depois da queda.
'Espírita' deve ser a tua conduta, ainda mesmo que estejas em duras
experiêncas.
'Espírita' deve ser o nome de teu nome, ainda mesmo respires em
aflitivos combates contigo mesmo.
'Espírita' deve ser o claro adjetivo de tua instituição,
ainda mesmo que, por isso, te faltem as passageiras subvenções
e honrrarias terrestres.
Doutrina Espírita quer dizer Doutrina de Cristo.
E a Doutrina de Cristo é a doutrina do aperfeiçoamento moral
em todos os mundos.
Guarda-a, pois, na existência, como sendo a tua responsabilidade
mais alta, porque dia virá em que serás naturalmente convidado
a prestar-lhe contas."
(Texto
retirado da revista "Reformador", Abril, 1996, pág. 33)
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